sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Intervenção do Ministério Público (Subturma10)

EXMO SR. DR. JUÍZ DE DIREITO
DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE
CÍRCULO E TRIBUTÁRIO DO PORTO



Data:12.12.2008
Processo: nº121/2008
Magistrado:Marta Florêncio e Sofia Seruya
Descritores: Acção administrativa especial de impugnação de actos administrativos.



De acordo com os artigos 1º e 3º do Estatuto do Ministério Público, art. 219º da Constituição da República Portuguesa e 85º, nº 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos compete ao Ministério Público representar o Estado e os interesses determinados por lei em defesa dos direitos fundamentais.


O Ministério Público apresenta as suas alegações:

O Ministério Público entendeu não proceder à realização de quaisquer diligências instrutórias em relação à petição inicial do “Belavista FC” e “Oporto FC”, nos termos do nº2 do artigo 85º do CPTA.

- A petição referida não obedece a requisitos indispensáveis para prosseguir.

- Não foram indicados todos os contra-interessados, segundo o disposto nos artigos 78º, nº2 e alínea f), 80º, nº1, alínea c), facto este que obsta ao prosseguimento do processo nos termos da alínea f), do nº1 do artigo 89º.

Na acção administrativa especial a lei obriga a indicação na petição inicial de eventuais contra-interessados.

- Os autores entendem terem sido realizadas duas reuniões, no entanto não fundamentaram tal facto, como tal não é possível haver pronunciamento sobre o fundo da questão de direito.


- No entanto, o Ministério Público irá pronunciar-se sobre duas questões suscitadas pelos autores.

- Os autores vêm pedir a nulidade das decisões tomadas na continuação da reunião sem a presença do Dr. Cartão Vermelho, nos termos do disposto no artigo 133º, nº2, alínea g) do CPA.

- Discute-se se houve ou não uma reunião tumultuosa que leva à nulidade das decisões tomadas na mesma.

O artigo 133º, nº2,alínea g) foi pensado para as situações em que haja um tumulto que provenha do interior do próprio orgão. Procura-se evitar a subsistência de “deliberações tomadas em situações perturbadoras da racionalidade da formação da vontade do orgão”, nas palavras do professor Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, no manual de Direito Administrativo Geral, tomo III, na página 165.

Tem que haver uma perturbação, não uma qualquer perturbação mas uma perturbação anormal da ordem, confusão ou turbulência. Nas palavras do Professor Freitas do Amaral “uma confusão geral”. Os autores afirmam no articulado 13º que houve tensão e conversas cruzadas, ora isto não é o que se entende por tumulto.

A reunião só seria nula se tivesse sido gravemente perturbada, mas não foi isso que ficou claro dos factos alegados pelos autores.

Assim sendo a reunião é válida nos termos da lei.

- No articulado 29º os autores invocam o artigo 14º, nº2 do CPA, mas este preceito refere-se às reuniões em si e não à tomada das decisões que nela ocorrem.

- Os mesmos autores, também invocam o artigo 21º do CPA que se refere à convocação das reuniões e não à legalidade das decisões.

O Ministério Público conclui que:

- A reunião é válida e como tal as decisões nela tomadas também o são.



As magistradas do Ministério Público,

Marta Florêncio e Sofia Seruya.



EXMO SR. DR. JUÍZ DE DIREITO
DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE
CÍRCULO E TRIBUTÁRIO DO PORTO


Data: 12.12.2008
Processo: nº121/2008
Magistrados: Marta Florêncio e Sofia Seruya
Descritores: Acção administrativa especial de impugnação de actos administrativos.



De acordo com os artigos 1º e 3º do Estatuto do Ministério Público, art. 219º da Constituição da República Portuguesa e 85º, nº 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos compete ao Ministério Público representar o Estado e os interesses determinados por lei em defesa dos direitos fundamentais.

Está aqui em causa uma reunião do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol (FPF).

O Conselho de Justiça é um dos órgãos da FPF. A FPF é uma pessoa colectiva de direito privado que foi declarada de utilidade pública desportiva. Como tal está incumbida do exercício privado de funções públicas.

O órgão social da FPF – O Conselho de Justiça - exerce funções de tipo disciplinar e jurisdicionais e é regulado pelo “Regimento do Concelho de Justiça”. O referido regimento manda aplicar o CPA e a Lei de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais, subsidiariamente.

O que aqui está em causa é a reunião do dia quatro de Julho, pelas 16h, a forma como ela decorreu, os motivos que levaram ao seu encerramento pelo Dr. Presidente antes de terem sido discutidos todos os pontos que constavam da ordem do dia e a validade das decisões tomadas na continuação da reunião só com a presença dos Vogais.

Estão em causa os actos do Dr. Cartão Vermelho, dos vogais Dr. Fintas e Dr. Troca Tintas.

O Ministério Público irá pronunciar-se sobre os factos que entendeu de maior relevância pelo desrespeito de que enfermam para com a Constituição da República Portuguesa e a Lei – o Código do Procedimento Administrativo, adiante designado por CPA.

O Ministério Público apresenta as suas alegações:

-O Ministério Público entendeu não proceder à realização de quaisquer diligências instrutórias em relação à petição inicial do “Dr. Cartão Vermelho”, Presidente do Conselho de Justiça da Federação Popular de Futebol, nos termos do nº2 do artigo 85º do CPTA.

- O autor declarou o impedimento do Dr. Fintas de acordo com o art. 45º nº 3 do CPA que refere que cabe ao Presidente do órgão colegial conhecer da existência do impedimento.

Trata-se no art. 45º do CPA do conhecimento de impedimentos no caso concreto que impedem a intervenção numa decisão ou num processo.

Neste caso, os requerimentos de declaração de impedimentos do Dr. Fintas referiam-se ao facto de ele ter dois cargos na Federação, o cargo de vogal no Conselho de Justiça e o cargo de perito para a arbitragem de litígios entre clubes ou sociedades anónimas desportivas, que os Estatutos da Federação não permitem (art. 13º n.º 2). Trata-se, então, de um caso de incompatibilidade e não de impedimento.

Assim, parece que existiu usurpação de poder pois é a Assembleia Geral que tem de verificar a incompatibilidade de cargos e não o Presidente do Conselho de Justiça. Desta forma, existe nulidade de acordo com o art. 133º n.º 1 b) do CPA.

- Dr. Fintas invoca incompetência material do Presidente para a declaração do impedimento, o que parece correcto visto que a competência seria da Assembleia Geral, como já vimos.

- Quanto à audição do Dr. Fintas, o Presidente, quando conheceu e declarou o impedimento, poderia ouvi-lo de acordo com o art. 45º n.º 3 do CPA. Parece ser possível não haver audiência se o Presidente não o considerar necessário mas temos de ter em conta o princípio do contraditório e a audiência dos interessados que consta do art. 100º do CPA.

- Nos articulados 121º e seguintes o autor afirma que usou dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 14º, nº3 do CPA para declarar encerrada a reunião.

Ora o nº3 do artigo 14º do CPA exige que se verifiquem três condições para poder ser accionado; quando “circunstancias excepcionais o justifiquem”; “mediante decisão fundamentada” e tendo que ser incluída na acta da reunião. Neste caso não estamos perante quaisquer circunstanciais excepcionais como é entendido em Direito. O que está na base das “circunstanciais excepcionais” é serem raras, “anormais” ou extraordinárias. Uma catástrofe natural seria uma situação extraordinária.

O Ministério Público é da opinião que o Presidente de um órgão colegial não pode encerrar uma reunião sem estarem preenchidos os requisitos necessários para o efeito segundo o disposto no nº3 do artigo 14º.

Através da matéria de facto alegada, não entendemos que exista aqui um tal estado de “nervosismo” ou “inquietação” que não permita um “discernimento claro, esclarecido, imparcial” por parte dos restantes vogais do Conselho de Justiça.

Neste sentido o Ministério Público inclina-se para a nulidade da decisão de encerrar a reunião, nos termos do nº1 do artigo 133º do CPA.

-Não entendemos “estranho” um vogal, propor a instauração de um processo disciplinar ao Presidente do CJ. É um Direito que lhe cabe, que não o ser permitido em última análise poderia ser considerado violador de princípios constitucionais como a Liberdade de expressão e informação do artigo 37º da Constituição da República Portuguesa.

O Ministério Público não encontrou cabal explicação para sustentar que o Dr. Troca Tintas tivesse tentado condicionar a actuação do Presidente na reunião.

De igual modo não vemos como a interposição de um processo disciplinar contra o Dr. Cartão Vermelho no seio da reunião, possa ser considerado o prosseguimento de um interesse privado.
Uma vez que o Presidente deve “dirigir os trabalhos e assegurar o cumprimento das leis e a regularidade das deliberações”, segundo o disposto no nº2 do artigo 14 do CPA.

- Quanto ao Dr. Cartão Vermelho tendemos a compreender que seguiu um interesse privado, ao querer encerrar repentinamente a reunião de maneira a que não fosse votado o processo disciplinar que o Dr. Troca Tintas propôs contra o Dr. Cartão Vermelho.

O Conselho de Justiça tinha competência para conhecer o processo disciplinar, nos termos do artigo 11º, nº1, alínea b) do Regimento do Conselho de Justiça da F.P.F.

Há aqui um vício de desvio de poder, que “decorre da preterição de requisitos de legalidade respeitantes ao fim e aos motivos dos actos administrativos”, quando o motivo principal determinante de um acto administrativo não visa a prossecução do fim legal – Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Manual de Direito Administrativo, Tomo III. O motivo principalmente determinante visa a prossecução de um interesse privado do titular do órgão.

A prossecução de um interesse privado em detrimento da prossecução de um interesse público – que é requisito essencial de um acto administrativo – é como tal, causa de nulidade, nos termos do artigo 133º, nº1 do CPA.

O acto não produzirá quaisquer efeitos jurídicos, é insanável, permanente, não depende de declaração jurisdicional e o acto não é vinculativo. Consequentemente o acto não poderá ser executado e é irrevogável.

- Sendo o encerramento da reunião considerado nulo, a continuação da mesma foi válida e produziu efeitos. Estava reunido o quórum exigido pelo art.5º do Regimento do Conselho de Justiça, pois permaneceram os 5 vogais na reunião e, portanto, a maioria dos membros.

A eleição pelos restantes vogais de um Presidente substituto é válida de acordo com o art. 4º do Regimento do Conselho de Justiça, que nos diz que na ausência do Presidente ou do Vice-Presidente a presidência é assumida pelo vogal indicado pelos membros presentes, o que ocorreu.

- A instauração de um processo disciplinar contra o Presidente do Conselho de Justiça já o dissemos ser admissível pois o Conselho de Justiça é o órgão competente para exercer o poder disciplinar em relação a qualquer membro de acordo com o art. 11 n.º 1 b) do Regimento do Conselho de Justiça. Mas este tema não constava da ordem do dia e não existiu votação quanto a ele.

Apesar do dever constitucional de se observar o princípio do contraditório, o que está aqui em causa é a decisão de instauração de um processo disciplinar nesta reunião em concreto e que, por não ter existido votação, está inquinada de um vício de forma que gera a anulabilidade, pois não consta dos casos de nulidade do art. 133º CPA.

- Quanto aos recursos que ficaram pendentes, já dissemos que a continuação da reunião foi válida e que todos eles constavam da ordem do dia e, por isso, as decisões que lhes dizem respeito são válidas, até porque foram todas a votação.

Não parece que viole o princípio democrático, nem que os vogais tenham agido de má fé, pois o encerramento da reunião é que foi considerado nulo.

- Em relação à deliberação de revogação do despacho de impedimento do Dr. Fintas, como a declaração de impedimento é nula por ser da competência da Assembleia Geral e não do Presidente do Conselho de Justiça pois tratava-se de incompatibilidade, não era necessária a revogação daquela porque sendo nula o objecto torna-se impossível.


O Ministério Público conclui que:

- Quanto à decisão de declaração do impedimento, deve ser considerada nula de acordo com o art. 133º n.º 1 b) do CPA.

- Em relação à audiência do Dr. Fintas compreendemos que não havia impedimento, como tal deve entender-se que há um vício de forma por falta de audiência dos interessados (art. 100º do CPA), que gera anulabilidade, pois não consta dos casos de nulidade do art. 133º do CPA.

- O encerramento da reunião deve ser considerado nulo. Para além de ofender a Constituição, ser violador da Lei e verificarmos a existência clara de Desvio de Poder.

- A eleição do Presidente substituto deve ser considerada válida (art. 4º do Regimento do Conselho de Justiça).

- A instauração de um processo disciplinar deve considerar-se inválido, gerando anulabilidade.

- As decisões tomadas quanto aos recursos devem ser válidas.



As magistradas do Ministério Público,

Marta Florêncio e Sofia Seruya.

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