sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Petição Inicial Belavista F.C / Sr. Jorge Nuno Costa do Pinto (Subturma 12)

Exmo. Senhor Doutor
Juiz de Direito
do Tribunal Administrativo
de Círculo do Porto



Belavista Futebol Clube, Futebol-SAD, pessoa colectiva n.º 503569046 com sede no Estádio Bessa SecXXI – Rua “O Primeiro de Janeiro” 4101-001 Porto

e

Jorge Nuno Costa do Pinto, casado, portador do Bilhete de Identidade n.º 12345678 emitido em 05/10/2000, pelo Arquivo de Identificação do Porto, contribuinte fiscal n.º 236515152, residente na Avenida da Boavista, n.º 5, 8.º Esquerdo, 4000- 485 Porto,

coligados ao abrigo do artigo 12.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), representados pela Exma. Sra. Dra. Constança Botelho, com domicílio profissional na Rua Tomás da Fonseca, n.º 10, 8.º Dto, 1700-255, na localidade de Lisboa,

vêm ao abrigo das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 46.º, do n.º 1 do artigo 51.º, do n.º 1 do artigo 66.º, da alínea b) do n.º 1 do artigo 67.º, do n.º 1 do artigo 47.º e da alínea a) do n.º 2 do artigo 47.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), intentar, nos termos do artigo 10.º, n.º 2 do CPTA, contra,

Federação Popular de Futebol, pessoa colectiva de direito privado de tipo associativo, sem fins lucrativos, de utilidade pública desportiva, com sede na Rua Alexandre Herculano, n.º 58, 1250-012 Lisboa, devendo ser citada na pessoa do seu presidente, Dr. Gilberto Madaíl, residente na Rua Garrett, n.º 10, 3.º Dto, 1700-123 Lisboa, de acordo com o artigo 30.º, n.º 1, alínea c) dos Estatutos da FPF,


ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL,

-Impugnação, mais concretamente, anulação, de Acto Administrativo

[De deliberação de reabertura da reunião do CJ (órgão da FPF a quem cabe o desempenho, nomeadamente, de funções de natureza disciplinar e jurisdicional, mais concretamente, o julgamento das decisões da Comissão Disciplinar da Liga Cash & Carry) após encerramento da mesma pelo presidente do CJ,

e consequentemente

anulação dos actos administrativos posteriormente praticados na mesma pelos restantes cinco vogais presentes (Dr. Fintas, Dr. Silva Mendes, Dr. Amorim Solnado, Dr. José Reis Salema, Dr. Troca-Tintas) nomeadamente:
- acto administrativo de revogação do despacho do Dr. Tomaz Amaral de considerar impedido o vogal Dr. Fintas
- acto administrativo de revogação, com fundamento em ilegalidade, da decisão de encerramento da reunião proferida pelo presidente do Conselho de Justiça]

-Impugnação, mais concretamente, declaração de nulidade, de Acto Administrativo

(Acto de suspensão preventiva com efeitos imediatos do presidente Dr. Tomaz Amaral, deliberado pelo CJ na segunda parte da reunião)

e

-Condenação à Prática de Acto Devido de deferimento dos recursos interpostos a 15 de Maio de 2008 dos acórdãos disciplinares da Comissão Disciplinar da Liga Cash & Carry, os quais sancionaram o Belavista Futebol Clube, Futebol-SAD e o Oporto Futebol Clube, Futebol-SAD, bem como respectivos presidentes, pela prática das infracções disciplinares tal como indicadas no Comunicado Oficial n.º 211/07-08, pp. 3 a 8 (v. anexo I), com intervenção do tribunal colectivo, ao abrigo do n.º 3 do artigo 40.º e n.º 3 do artigo 6.º, ambos do ETAF e n.º 2 do artigo 34.º do CPTA.

[As decisões do CJ quando transitadas constituem caso julgado, nos termos do artigo 56.º, n.º 1 do Regimento do Conselho de Justiça (aprovado na Assembleia-Geral Extraordinária de 28 de Agosto de 1999, com as alterações introduzidas em 2000 e 2001, o qual regula em primeiro plano o funcionamento do mesmo, e cujo artigo 76.º manda aplicar subsidiariamente o CPTA), não havendo recurso das mesmas para qualquer outro órgão social da FPF ou da justiça desportiva nacional, com a ressalva do recurso que a lei admite para os tribunais administrativos. Como o Oporto F.C. não recorreu das decisões condenatórias proferidas pela Comissão Disciplinar da Liga, aceitando perder 6 pontos na classificação final no Campeonato da época 2007/2008, a decisão condenatória transitou portanto em julgado relativamente ao mesmo.]


o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos:

A) Dos Factos:



Às 16h00 do dia 4 de Julho de 2008 teve início a reunião do Conselho de Justiça da Federação Popular de Futebol, uma hora depois do que estava previsto, devido ao atraso do presidente do mesmo Conselho, Dr. Tomaz Amaral.



A mesma decorreu inicialmente de acordo com a ordem de trabalhos prevista, tendo sido decididos, por unanimidade, os três primeiros processos de recurso inscritos na tabela anexa à ordem de trabalhos.




Cerca das 17h00, o presidente do CJ, Dr. Tomaz Amaral, invocando ter de se ausentar por alguns instantes, levantou-se e pediu ao secretário do mesmo órgão, Dr. Roberto Leal, que o acompanhasse, pelo que saíram ambos da sala.




A reunião ficou, desta forma, suspensa.



Dirigiram-se ambos para uma outra sala, tendo o Dr. Tomaz Amaral pedido que um documento contido numa disquete que tinha trazido consigo do Porto, fosse impresso em duplicado e em papel timbrado do CJ. O documento em causa intitulava-se “Decisão dos Incidentes de Impedimento e Suspeição do Conselheiro Dr. Fintas suscitados por Belavista FC e por Costa do Pinto” (v. anexo IV). As duas vias daquele documento foram rubricadas e assinadas pelo presidente do CJ.



De seguida, o Dr. Tomaz Amaral pediu ao Dr. Roberto Leal que chamasse o Dr. Fintas, o que aquele fez, telefonando para a sala onde se encontravam os restantes membros do CJ.



O presidente do CJ determinou ao secretário, Dr. Roberto Leal, que notificasse o Dr. Fintas, visado na decisão constante do documento acabado de assinar.



Pediu ao Dr. Roberto Leal, para o efeito, que nele inscrevesse, à mão, o seguinte texto: “ Nesta data notifiquei pessoalmente o Dr. Fintas, Conselheiro do CJ da Federação Popular de Futebol. 04.07.2008, 17h15m”.



A essa hora a reunião foi retomada.

10º

Nesse momento, o presidente entregou ao vogal Dr. Fintas uma notificação da decisão por si tomada no sentido de o considerar impedido quanto aos processos de recurso nºs 36, 37-38, 39-40, 41-42-43 e 44-45, todos referentes à época de 2007/2008.

11º

O presidente pediu ao vogal Dr. Fintas que tomasse conhecimento da decisão por escrito, assinando-a.

12º

Este último inscreveu na mesma o seguinte texto: “Tomei conhecimento. Alego incompetência material, remetendo a questão para o Pleno do CJ da FPF. 04/07/2008”.

13º

Seguidamente, o presidente explicou os motivos da sua decisão e recusou dar a palavra ao vogal Dr. Fintas por este ter já respondido por escrito a dois requerimentos de impedimento de conteúdo idêntico na véspera da reunião.

14º

Na sequência disto, foram trocadas palavras coléricas entre o presidente e o referido vogal. O Dr. Fintas reagiu mal à notificação e dirigiu-se-lhe nos seguintes termos: “vai para o raio que te parta!”

15º

A decisão, segundo o mesmo vogal, seria inválida e, por isso, apelando para o pleno do CJ, recusou-se a abandonar a reunião.

16º

O Dr. Tomaz Amaral justificou a sua competência para decidir sozinho o impedimento do vogal com base no Código do Procedimento Administrativo (em especial, artigos 45º e 50º).

17º

Entretanto, num ambiente de muita tensão e alvoroço e em que existiam conversas cruzadas, o vogal Dr. Troca-Tintas disse: “ Presidente, ou revogas a decisão ou levas com um processo disciplinar com suspensão imediata!”.

18º

Foi a partir deste momento que o Dr. Tomaz Amaral decidiu só dar a palavra a todos os demais membros do CJ que pretendessem intervir, na condição de o fazerem ditando directamente para a acta.


19º

Nesse momento, o Dr. Troca-Tintas pede a palavra e dita para a acta os requerimentos referentes à instauração de um processo disciplinar ao presidente do CJ e à sua imediata suspensão de funções.

20º

Logo de seguida, considerando não existir nem a calma nem a serenidade suficientes para prosseguir a reunião, devido ao tumulto que se tinha instalado, e sentindo-se coagido em virtude da ameaça anteriormente feita pelo vogal Dr. Troca-Tintas, o Dr. Tomaz Amaral ditou o despacho transcrito na acta, o qual culmina com a declaração de encerramento imediato da reunião pelas 17h55m (v. anexo II).

21º

Posto isto, o presidente do CJ abandonou a sala em que estava a decorrer a reunião, pedindo ao secretário Dr. Roberto Leal que o acompanhasse, a fim de elaborar imediatamente a acta, uma vez que não queria sair do edifício-sede da FPF sem que a acta fosse lavrada pelo secretário e assinada por ambos.

22º

O Dr. Roberto Leal saiu com o presidente.

23º

A acta da reunião do CJ de 4 de Julho de 2008, tal como lavrada pelo Dr. Roberto Leal, sob a direcção imediata do Dr. Tomaz Amaral, e por ambos rubricada e assinada, foi também presente aos vogais do CJ que decidiram continuar aquela reunião, mesmo na ausência do presidente e do vice-presidente daquele órgão.

24º

Os mesmos vogais, por considerarem que o conteúdo daquele documento descrevia o que efectivamente se tinha passado desde o início da reunião até à declaração do seu encerramento pelo Dr. Tomaz Amaral, cerca das 17h55m, decidiram todos, no final, cerca das 00h45m do dia 5 de Julho, isto é, quando foram dados por concluídos os trabalhos agendados para a reunião do dia 4, rubricar também as fls. 24 e 25 do Livro de Actas.

25º

Uma vez decidido não reconhecer efeitos à declaração de encerramento da reunião do CJ de 4 de Julho de 2008 proferida pelo seu presidente, e atenta a ausência do vice-presidente, os restantes membros daquele órgão começaram por indicar o vogal, Dr. Mendes da Silva para dirigir os trabalhos – por ser ele o vogal que, entre os presentes, ocupava a posição mais elevada na lista eleita na Assembleia Geral.

26º

Todavia, o Dr. Silva Mendes, e como consta da acta, não aceitou tal incumbência por se sentir momentaneamente indisposto.

27º

Do qualquer modo, este vogal não só não abandonou a sala, como também continuou a participar na reunião, na sua qualidade de vogal.

28º

Para presidir à reunião foi então designado, “por consenso dos membros presentes”, o vogal Dr. Troca-Tintas – eis o nome que figurava imediatamente a seguir na citada lista eleita em Assembleia Geral (v. anexo III).

29º

Durante a 2ª parte da reunião foram aprovadas as seguintes seis decisões que constam de fls. 26 e 26, verso, do Livro de Actas n.º 1 do mandato de 2007 a 2011 do CJ (ver anexo III):

1.Para o caso de não ser considerado nula a decisão de encerramento da reunião proferida pelo presidente do CJ, a revogação da mesma com fundamento em ilegalidade (cinco votos a favor);
2.Sob proposta do presidente do CJ em exercício e após o mesmo se ter ausentado da sala, a instauração de um processo disciplinar ao presidente titular do CJ Dr. Tomaz Amaral (a votação, por voto secreto, teve o seguinte resultado: três votos a favor e um em branco);
3.Nos mesmos termos, a suspensão preventiva imediata do presidente (votação e resultados idênticos aos referidos no número anterior);
4.A participação, nomeadamente através do “envio de fotocópias das actas” daquela reunião, da deliberação de instaurar um processo disciplinar ao Dr. Tomaz Amaral e de suspender imediatamente o exercício das suas funções enquanto presidente do CJ, ao Presidente da Assembleia Geral e ao presidente da FPF “ para os fins tidos por convenientes” (cinco votos a favor);
5.A revogação do despacho do Dr. Tomaz Amaral de considerar impedido o vogal Dr. Fintas quanto aos processos de recurso nºs 36 a 45 (cinco votos a favor);
6.A deliberação de não apreciar, por inutilidade superveniente, o pedido de suspeição oposto pelo Capital do Móvel FC ao Dr. Tomaz Amaral, enquanto presidente do CJ (cinco votos a favor).

30º

Após estas votações, a reunião foi interrompida, das 21h30m às 23h00, para jantar.

31º

Foram retomados os trabalhos, pelas 23h00.

32º

A reunião prosseguiu até cerca das 00h45m.

33º

Nesta terceira parte apreciaram-se os recursos inscritos na “Tabela – Recursos” respeitantes ao caso “Apito Final” – processos de recurso nºs 36, 37-38, 39-40, 41-42-43, 44-45 e 46, tendo sido adoptadas as decisões referidas na fl.27 do Livro de Actas nº 1 do mandato de 2007 a 2011 do CJ (v. anexo III e anexo VI).

34º

O Dr. Silva Mendes votou coerentemente com as posições por si assumidas na reunião preparatória de 16 de Junho de 2008, data em que, ao lado do vice-presidente, se pronunciou contra a admissibilidade e valoração como meio de prova em processo disciplinar de escutas telefónicas ou de transcrições das mesmas constantes de certidões extraídas de processos do foro criminal.


35º

Relativamente aos demais recursos decididos nesta fase da reunião, as decisões recorridas pressuponham a admissibilidade de tais meios de prova em processos disciplinares.

36º

Consequentemente, decidiu o Conselho pelo não provimento dos recursos, por maioria, 4 votos a favor e um contra, justamente do Dr. Silva Mendes que, em cada caso, juntou uma declaração de voto (v. anexo V).

37º

A terceira e última parte da reunião do CJ de 4 de Julho de 2008 foi encerrada às 00h45m.


B) Do Direito:

38º

Nos termos do artigo 18.º da Lei n.º 5/2007, de 16 de Janeiro, “os litígios emergentes dos actos e omissões dos órgãos das federações desportivas e das ligas profissionais no âmbito do exercício dos poderes públicos, estão sujeitos às normas do contencioso administrativo, ficando sempre salvaguardados os actos desportivos entretanto validamente produzidos ao abrigo da última decisão da instância competente da ordem desportiva.”

39º

Nos termos dos artigos 9.º, n.º 1, 55.º, n.º 1, alínea a) e 68.º, n.º 1, alínea a) do CPTA, os autores têm legitimidade activa para impugnação dos actos administrativos de reabertura da reunião do CJ e posteriores actos nesta praticados e para requerer a condenação à prática do acto devido de deferimento dos recursos interpostos.


40º

Constituindo as decisões do Conselho de Justiça caso julgado, nos termos do artigo 55.º e 56.º, n.º 1 do Regimento do CJ, tornam-se obrigatórias e executórias para todos os órgãos, sócios e agentes da FPF, nos termos do artigo 56.º, n.º 2.

41º

Neste caso, o recurso interposto pelo Belavista F.C. tinha efeito suspensivo, causando a suspensão da decisão sancionatória da Liga até à decisão final do órgão competente para apreciar o recurso da mesma (o CJ).

42º

Transitando em julgado a decisão de não provimento do recurso, só neste momento se começaram a produzir os efeitos da decisão sancionatória da Comissão Disciplinar da Liga Cash&Carry. Assim:

43º

Quanto ao acto de reabertura da reunião às 19h15 pelos restantes cinco vogais do CJ e de designação por estes do presidente e vice-presidente substitutos, como exposto, estes decorrem do facto de ter havido o encerramento da reunião por parte do presidente do CJ, às 17h55.

44º

Nos termos do artigo 14.º, n.º 3 do Código do Procedimento Administrativo (CPA), verificaram-se “circunstâncias excepcionais”, as quais impunham como melhor solução o encerramento da reunião. Como expõem Mário Esteves de Oliveira/Pedro Costa Gonçalves/J. Pacheco de Amorim, em Código do Procedimento Administrativo Anotado, 2.ª Edição, 6.ª Reimpressão da Edição de 1997, Almedina, p. 151, em anotação ao artigo, “só pode - por razões óbvias - ser usado em circunstâncias excepcionais ou quando a lei o impõe; ou então, o presidente deixava de ser um par inter pares”

45º


Assim, pelo facto de a reunião se ter tornado tumultuosa, conforme se pode aferir dos factos constantes dos artigos 14.º, 17.º e 20.º, provocando desordem, com gritaria entre os membros do órgão colegial, causando uma confusão geral, não estavam reunidas as condições necessárias que garantiam uma votação livre e esclarecida por parte dos membros do órgão colegial.

46º

Logo, quaisquer deliberações tomadas neste período seriam nulas e ineficazes (artigo 133.º, n.º 2, alínea g) do CPA).

47º

Consequentemente, a decisão de encerramento da reunião pelo presidente do Conselho de Justiça encontra-se justificada e devidamente fundamentada, como consta da acta referente à primeira parte da reunião, (v. anexo II), tendo visado assegurar a liberdade e integridade física dos membros do Conselho de Justiça, garantindo igualmente as condições necessárias para uma tomada de decisão livre e esclarecida.


48º

Porém, é certo que a mesma padece do vício de violação de lei, sendo consequentemente anulável, nos termos do artigo 135.º do CPA, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 266.º, n.º 2 da CRP), já que a medida tomada pelo presidente como forma de salvaguardar a correcta tomada de decisões no interior do órgão ao qual preside não constitui a solução menos gravosa, a qual passaria, nomeadamente, pela suspensão daquela.

49º

Por conseguinte, encontravam-se verificados dois dos três requisitos essenciais que segundo o artigo 14.º, n.º 3 do CPA permitiriam o encerramento antecipado da reunião pelo presidente, a saber, a existência de circunstâncias excepcionais e a fundamentação devida da decisão de encerrar a referida reunião.

50º

Sendo anulável, por a solução menos gravosa não passar pelo encerramento imediato da reunião, o acto de encerramento da mesma era contudo eficaz, produzindo efeitos até à sua anulação.

51º

Para mais, como já exposto, não há qualquer nulidade resultante de vício de desvio de poder por motivo de interesse privado, a qual resultaria da ausência de um elemento essencial do acto administrativo, nos termos do artigo 133.º, n.º 1 do CPA, in casu, o fim de interesse público.

52º


Como exposto supra, o presidente, embora praticando um acto violador do princípio da proporcionalidade, na vertente de eficácia, fê-lo com o único objectivo de salvaguardar o exercício livre e esclarecido do direito de voto, ameaçado pelo tumulto gerado na reunião pelas ameaça do vogal Troca-Tintas e pelas iradas palavras do vogal Fintas.

53º

Por conseguinte, pese embora não tenha havido prosseguimento do interesse público de realização célere da reunião de forma a permitir a apreciação dos requerimentos de recurso (o interesse público desportivo no âmbito do futebol), o motivo principalmente determinante da prática do acto de encerramento pelo presidente foi ele próprio, também, um motivo de interesse público, o do bom e regular funcionamento da reunião a que aquele presidia.


54.º

Assim, o acto de encerramento seria quanto muito anulável, nos termos do artigo 135.º do CPA.


55º

Daqui decorre que o acto posterior de reabertura da reunião, praticado pelos cinco vogais supra mencionados (v. anexo III), enferma do vício de violação de lei, sendo consequentemente anulável, nos termos do artigo 135.º do CPA, na medida em que, de acordo com o artigo 4.º do Regimento do Conselho de Justiça ( o qual prevalece sobre o 15.º do CPA), apenas no caso de falta ou impedimento do presidente do órgão colegial, assume a presidência o vice-presidente, ou na falta de ambos, o vogal indicado pelo Conselho.

56º

Assim é porque a deliberação de suspensão preventiva do presidente do CJ é nula, nos termos do artigo 133.º, n.º 2, alínea d) do CPA, na medida em que, enquanto acto lesivo, seja ou não definitivo, impõe a existência de audiência prévia dos interessados, sendo que a falta de audiência dos interessados (artigo 100.º do CPA) é geradora de nulidade por violação do conteúdo essencial de um direito fundamental.


57º

Logo, a decisão de suspensão do presidente não produzia qualquer efeito.

58º

Por conseguinte, o presidente não se encontrava suspenso, não havendo “falta” ou “impedimento” que justificasse a posterior deliberação de substituição do mesmo.

59º


É certo que a alínea a) do n.º 1 do artigo 103.º do CPA exclui a necessidade de audiência dos interessados quando a decisão seja urgente. Contudo, a existência de urgência teria de ser expressa e adequadamente fundamentada, não o sendo neste caso, senão com referências vagas à “salvaguarda da autoridade e prestígio da organização desportiva de futebol”. Ora, esta referência não permite justificar a urgência da sua imposição sem audiência prévia do presidente.


60º

Para mais, nos termos do artigo 17.º, n.º 2 da lei n.º 5/2007, de 16 de Janeiro, “…as deliberações para a designação dos titulares de órgãos, ou que envolvam a apreciação de comportamentos ou das qualidades de qualquer pessoa, são tomadas por escrutínio secreto.” Assim, não parece proceder o entendimento de Freitas do Amaral quanto à não aplicação do referido artigo ao caso em análise, na medida em que está em causa uma deliberação de um órgão de uma federação desportiva que se destina à designação de um titular desse mesmo órgão.

61º


Mesmo que este acto não fosse nulo, seria sempre anulável, por vício de forma, devido a preterição de formalidade essencial, por inobservância do artigo 19.º do CPA, já que este assunto não estava incluído na ordem do dia.

62º

Acresce que, como exposto, a reunião tinha sido encerrada pelo órgão competente e pese embora anulável, o acto de encerramento produzia efeitos até à sua anulação.


63º


Por conseguinte, o acto de reabertura da reunião deverá ser considerado anulável, por violação de lei, na medida em que o acto de suspensão do presidente era nulo “ e de nenhum efeito”, não podendo a reunião prosseguir na sua ausência nem este ser legalmente substituído.

64º

Já quanto ao vogal Dr. Fintas, este acumulava dois cargos, o de vogal e o de perito inscrito na lista a que se reporta o artigo 14.º do “Regulamento do Estatuto da Inscrição e Transferência de Jogadores”, que os Estatutos da FPF proíbem que sejam cumulados, no seu artigo 13.º, n.º 2 e artigo 8º do Decreto-Lei n.º 112/99, de 3 de Agosto.

65º

Sendo esta uma situação de incompatibilidade, a declaração da mesma seria da competência do presidente da Assembleia Geral da Federação, nos termos do artigo 17.º, alínea c), 18.º, 71.º, n.º 4 dos Estatutos da FPF, com recurso para o plenário da Assembleia Geral, nos termos do artigo 23.º, n.º 5 dos Estatutos.

66º


Consequentemente, a decisão do presidente, praticada às 17h15 do dia 4 de Julho, e notificada ao Dr. Fintas, apesar de encerrar de manifesto erro de direito, por ter sido praticada ao abrigo do artigo 45.º, n.º 3 do CPA (na medida em que o presidente considerou erradamente estar em causa um caso de impedimento e não de incompatibilidade genérica) seria anulável, nos termos do artigo 135.º do CPA, já que a prática por um órgão (Conselho de Justiça) de um acto que seja da competência de outro órgão (Assembleia Geral), da mesma pessoa colectiva, gera mera anulabilidade, como se retira a contrario sensu do artigo 133.º, n.º 2, alínea b) do CPA.

67º

Produzia porém efeitos, determinando a impossibilidade de o vogal Dr. Fintas tomar parte na reunião, não tendo pois direito a ficar na sala e a votar na mesma, embora sem consequências em termos de quorum (artigo 22.º do CPA e 5.º do Regimento do CJ), por mesmo na ausência deste estar reunida a maioria legal dos membros do Conselho de Justiça.

68º

Assim, as decisões tomadas por esta formação do Conselho de Justiça encerram do vício que a doutrina germânica designa por “vício da composição do órgão”, na medida, como exposto, em que as decisões tomadas na segunda e terceira partes da reunião o foram sem a presença do seu presidente, não podendo este ser legalmente substituído, e com a presença de um vogal em relação ao qual existia uma decisão de impedimento que produzia efeitos.


69º

Logo, os actos posteriormente praticados na segunda e terceira partes da reunião, nomeadamente, a revogação do acto de encerramento da reunião por ilegalidade e a revogação do despacho do Dr. Tomaz Amaral de considerar o vogal Dr. Fintas impedido quanto aos processos de recurso n.º 36 a 45, bem como a subsequente apreciação dos requerimentos de recurso, devem ser considerados anuláveis, porque praticados pelo órgão colegial sem a presença do presidente, com a sua inválida substituição e ainda com a presença do Dr. Fintas.


70º


Do ponto de vista da legalidade orgânica as decisões foram tomadas pelo órgão competente para apreciar o recurso das decisões sancionatórias proferidas pela Comissão Disciplinar da Liga.

71º

Também quanto à legalidade formal, as decisões foram vertidas para acta, aprovada nos termos do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 144/93 e porque respeitaram as exigências de publicidade, eram eficazes, nos termos do artigo 27.º, n.º 4 do CPA.


72º

Porém, como visto, a nível procedimental e processual, a formação do Conselho de Justiça legalmente exigida para a tomada de decisões foi violada.

73º

Pelos fundamentos expostos, e reiterando, a apreciação dos requerimentos de recurso mencionados deve ser considerada anulável.

74º

Por conseguinte, pede-se a condenação da Federação Popular de Futebol a uma célere apreciação e deferimento dos recursos apresentados (aos quais foi negado provimento, tendo sido confirmadas sem alteração as decisões sancionatórias da Comissão Disciplinar da Liga), nos termos do artigo 66.º, n.º 1, e 67.º, n.º 1, alínea b) do CPTA, tendo os autores legitimidade, nos termos do artigo 68.º, n.º 1, alínea a) do CPTA, pelas razões a seguir elencadas.

75º

A utilização das escutas telefónicas provenientes do processo penal denominado “Apito Dourado” só seria possível nos termos do artigo 187.º do Código de Processo Penal (CPP), na medida em que o seu n.º 7 prevê que a utilização de escutas “só pode ser utilizado em outros processos, em curso ou instaurados, se tiver resultado da intercepção de meio de comunicação utilizado por pessoa referida no n.º 4 ou na medida em que seja indispensável à prova do crime previsto no n.º 1”.

76º

Ora o n.º 1 do referido artigo aplica-se apenas a um catálogo de crimes, taxativo, e não a infracções de natureza não penal, como o são os processos disciplinares e decisões disciplinares da Comissão Disciplinar da Liga, dos quais se interpõe recurso.

77º

Seria mesmo inaceitável permitir a utilização das mesmas naqueles processos (disciplinares) quando estas eram proibidas na grande maioria dos processos crime, por não se verificar um dos crimes constantes do catálogo (concretização da proibição constitucional da ingerência das autoridades públicas na correspondência e demais meios de comunicação, proibição essa taxativa, só admitindo excepção nos processos relativos aos denominados “crimes de catálogo”).

78º

Para mais, fere o direito daquelas pessoas, que não estando relacionadas com o crime investigado vêem os seus direitos violados pelo facto de comunicarem com o suspeito da prática de um crime.

79º

Assim, a utilização das escutas fora dos requisitos acima enunciados seria nula, nos termos do artigo 190.º do Código de Processo Penal, por violação dos seus artigos 187.º, 188.º e 189.º. A prova validamente adquirida (em processo penal) não tem garantida a admissibilidade da sua utilização (em processo disciplinar), mediante certidões extraídas de processos do foro criminal contendo a inscrição das escutas realizadas no quadro da investigação efectuada nesses processos.

80º

Para mais, a sua utilização levaria a uma clara violação de direitos fundamentais dos arguidos, constitucionalmente consagrados no artigo 34.º, o qual proíbe toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência e nos demais meios de comunicação, bem como o direito à palavra e à reserva da vida privada, constitucionalmente consagrados e garantidos pelos artigos 26.º, n.º 1 e 34.º, n.º 4, sendo assim a sua utilização nos processos disciplinares também geradora de nulidade.
Tal entendimento é subscrito, nomeadamente, por Costa Andrade.

81º


Consequentemente, por nulidade do meio de prova utilizado nos processos disciplinares que motivaram os acórdãos sancionatórios da Comissão Disciplinar da Liga, pede-se o deferimento dos recursos apresentados.




Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, deverá a presente acção ser julgada provada e procedente, e, por via dela,

A)serem anulados os actos administrativos de reabertura da reunião do CJ, de revogação do despacho do Dr. Tomaz Amaral de considerar impedido o vogal Dr. Fintas e de revogação da decisão de encerramento da reunião proferida pelo presidente do Conselho de Justiça

B) ser declarado nulo o acto de suspensão preventiva com efeitos imediatos do presidente Dr. Tomaz Amaral


e

C) ser a Federação Popular de Futebol condenada a realizar nova reunião para apreciação, dando provimento, aos recursos interpostos das decisões sancionatórias da Comissão Disciplinar da Liga pelo Belavista Futebol Clube- Futebol SAD e Senhor Jorge Nuno Costa do Pinto

Contra-interessados:

Liga Cash & Carry, sita na Rua da Constituição, N.º 2555, 4250-173 Porto, representada em juízo pelo respectivo presidente, Dr. José António Fiúza, residente na Rua Dr. António Fiúza, n.º 3, R/c esquerdo, 4750-007, Barcelos, nos termos do artigo 38.º, n.º 2, alínea b) dos Estatutos da Liga.

Capital do Móvel FC, Futebol-SAD, pessoa colectiva n.º 535796108 com sede na Rua do Estádio, Apartado 26, 4594-909 Paços Ferreira, representada em juízo pelo respectivo presidente, Dr. Fernando Sequeira, residente na Rua D. Amélia, n.º 3, 27.º Esq., 4594-909, Paços de Ferreira.

Vitória de Lisboa SC, Futebol-SAD, pessoa colectiva n.º 564212123 com sede na Rua Capitão Moura, N.º1, 1700-567 Lisboa, representada em juízo pela respectiva presidente, Dra. Adelina Falâncio, residente na Rua do Caco, n.º 165, 33.º C, 2835-175, Baixa da Banheira.

Valor: Superior a €30.000 ( trinta mil euros)

Superior à alçada do Tribunal Central Administrativo, nos termos do n.º 2 do artigo 34.º do CPTA, conjugado com o n.º 4 do artigo 6.º do ETAF, o qual remete para o artigo 24.º, n.º 1 da lei n.º 3/99, de 12 de Janeiro (LOFTJ).

Forma de processo: Havendo coligação, com cumulação de pedidos (de impugnação de acto administrativo e de condenação à prática do acto devido), a presente petição segue a forma de acção administrativa especial, como consta das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 46.º, do n.º 1 do artigo 51.º, do n.º 1 do artigo 66.º, do n.º 2 do artigo 12.º e alínea a) do n.º 2 do artigo 47.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).


Junta: Seis documentos, procuração forense, duplicados e cópias legais, comprovativo do prévio pagamento de taxa de justiça inicial.


Prova

a)documental
-os seis documentos juntos com a presente peça

b)testemunhal

1.ª- Dr. Roberto Leal, residente na Avenida da República, n.º 5, 3.º Dto, 1700-209, Lisboa.

2.ª- Dr. Francisco Silva Mendes, residente na Avenida Estados Unidos da América, n.º 10, 5.º Dto, 1700-350, Lisboa.


P.D.

A Advogada,

Constança Botelho


Contribuinte n.º 234567890


Com domicílio profissional na Rua Tomás da Fonseca, n.º 10, 8.º Dto, 1700- 255 Lisboa

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