sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

(subturma 11) Sentença

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DO PORTO
Processo nº 11/2008

Autores:
- “BELAVISTA F.C., FUTEBOL, S.A.D”, sociedade anónima desportiva, com sede na Av. da Belavista, Estádio do Omessa, 4050-555 Porto, registada na Conservatória de Registo Comercial do Porto – 1.º Secção, sob o número único de matrícula e de pessoa colectiva 445 554 445, com o capital social de €11 000 000,00 (onze milhões de euros), representada pelo Presidente do Conselho de Administração, Dourado Filho, casado, empresário e residente na Rua das Bolas Brancas, n.º 455, 4055-054 Porto,
- “OPORTO F.C, FUTEBOL, S.A.D”, sociedade anónima desportiva, com sede no Estádio Dragonstea, Av. do Super Estádio, 4055-555 Porto, registada na Conservatória de Registo Comercial do Porto – 1.ª Secção, sob o número único de matrícula e de pessoa colectiva 540 544 500, com o capital social de €15 000 000,00 (quinze milhões de euros), representada pelo Presidente do Conselho de Administração, Costa do Pinto, casado, empresário e residente na Rua de Sta. Carolina, n.º 666, 4055-045 Porto
- DOURADO FILHO, casado, empresário e residente na Rua das Bolas Brancas, n.º 455, 4055-054 Porto
- COSTA DO PINTO, casado, empresário e residente na Rua de Sta. Carolina, n.º 666, 4055-045 Porto.

Demandada:
- “FEDERAÇÃO POPULAR DE FUTEBOL”, associação de direito privado de utilidade pública, com sede na Rua dos Pilins, n.º 28, 1220-086 Lisboa

Contra-interessados:
- CAPITAL DO MÓVEL F.C.
- VITÓRIA DE F.C. Futebol SAD, com sede na Avenida Norton de Matos, nº 45, Freguesia de Benfica, concelho de Lisboa
- A “LIGA CASH AND CARRY DE FUTEBOL”, associação de Direito Privado de utilidade pública, com sede na Rua da Constituição, nº 2555, Freguesia do Bonfim, 4050-555 Porto, representada pelo Presidente da Liga enquanto órgão, Jorge Amaral Vieira, casado e residente na Rua do LIDL, nº 999, 4055-133 Porto

<Na presente acção, os AA. Belavista F.C., Oporto F.C, Dourado Filho e Costa do Pinto vêm pedir, ao abrigo dos artigos 51.º n.º 1 Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante CPTA), 66º CPTA:
- a declaração de invalidade dos actos administrativos que declararam improcedentes os recursos por estes interpostos no Conselho de Justiça objecto de deliberação na reunião de 4 de Julho de 2008.
- a condenação do Conselho de Justiça á pratica de acto administrativo, obrigando a pronunciar-se novamente sobre os referidos recursos
- caso não seja possível a reconstituição da situação hipoteticamente existente, que a R seja condenada ao ressarcimento dos danos sofridos pelos AA

O A. José Manuel Espadinha vem pedir, ao abrigo do artigo 51º nº1 CPTA:
- a declaração de inexistência de todos os actos administrativos praticados na alegada segunda parte da reunião do Conselho de Justiça de 4 de Julho de 2008
ou subsidiariamente, na hipótese de o Tribunal se pronunciar pela invalidade do encerramento da dita reunião,
- a anulação da deliberação relativa à suspensão e instauração de processo disciplinar ao A.

1 - Os fundamentos podem resumir-se assim:
- Foi marcada uma reunião para o dia 4 de Julho de 2008 para, nomeadamente, julgar os recursos interpostos pelos AA relativos às sanções impostas aos mesmos pela Federação Popular de Futebol (doravante FPF).
- A reunião começou por decorrer dentro da normalidade sendo cumprida a ordem de trabalhos prevista.
- No decorrer da reunião, o Presidente do Conselho de Justiça (doravante CJ) suscitou a questão do impedimento do Dr. Fintas, Vogal do Conselho de Justiça, facto que originou a tumultuosidade da reunião.
- Assim, deixaram de estar reunidas as condições mínimas indispensáveis à continuação da reunião, por não estarem garantidas as condições para o exercício da liberdade de expressão e direito de voto de forma livre e esclarecida.
- Por estes motivos, o Presidente decidiu encerrar a reunião, tendo-se ausentado da sala, acompanhado pelo Vice-presidente.
- Este acto não pode ser qualificado como uma mera interrupção da reunião, já que o Presidente ditou directamente para a acta que a mesma estava encerrada, acta que foi assinada por todos os membros do Conselho de Justiça.
- Não obstante, os cinco restantes membros do Conselho de Justiça permaneceram na sala e deliberaram ilegalmente sobre os recursos interpostos pelos primeiros AA, a suspensão do mandato do Presidente do Conselho de Justiça e ainda a instauração de um processo disciplinar contra o mesmo.
- Tendo sido a reunião anteriormente encerrada, este segundo momento não passou de um encontro informal de alguns vogais do Conselho de Justiça, não tendo as suas deliberações qualquer validade.

2 - Citada regularmente contestou a Ré, alegando em síntese:
- Apesar de alguma tensão e nervosismo próprios de um órgão colegial, onde as opiniões divergem, a reunião decorreu sem qualquer tumulto.
- Assim o encerramento da reunião do Conselho de Justiça do dia 4 de Julho não é válido por várias razões:
- não verificação de uma situação excepcional exigida pelo artigo 14.º n.º3 do Código do Procedimento Administrativo (doravante CPA).
- falta de fundamentação da decisão de encerramento a incluir na acta, tal como decorre da disposição supra mencionada.
- ainda que se pudesse considerar a existência de algum nervosismo, não foi observado o principio da proporcionalidade que impunha a adopção de uma medida menos gravosa como a suspensão ou o adiamento da reunião, mas não o seu encerramento.
- violação do princípio da prossecução do interesse público dado que o Presidente orientou a sua decisão por interesses pessoais, nomeadamente a preservação da sua posição enquanto presidente e a manutenção de uma decisão que havia idealizado.
- Consequentemente a continuação da reunião e as deliberações nela tomadas são válidas, uma vez que o órgão colegial não pode ficar refém dos caprichos do seu presidente.

3 – O Ministério Público é de parecer que a acção deve proceder, já que o encerramento da reunião pelo Presidente CJ é válido, à luz do artigo 14.º n.º3 e 133.º n.º2 g) ambos do CPA. Assim, a continuação da reunião a que procederam os 5 vogais do CJ não tem validade, por um lado, porque esta tinha sido já legitimamente encerrada pelo seu Presidente, e também por violar o artigo 2.º Constituição da República Portuguesa (doravante CRP).
Mesmo que fosse considerada válida a continuação da reunião, são invalidas as deliberações tomadas por padecerem um vicio de desvio de poder que comina com a anulabilidade.



II – Matéria de facto assente
A) A punição dos clubes de futebol Belavista F.C e Oporto F.C. pela Comissão Disciplinar da “Liga Cash and Carry de Futebol”, respectivamente com a descida de divisão e a perda de 6 pontos.
B) Da mesma decisão resultou a punição dos Presidentes desportivos Dourado Filho e Costa do Pinto, por um período de 4 e 2 anos, respectivamente.
C) Em 15 de Maio de 2008, estes A.A. interpuseram recurso desta decisão para o Conselho de Justiça da Federação Popular de Futebol.
D) Foi agendada uma reunião para decisão dos recursos para o dia 4 de Julho, pelas 15h.
E) A reunião teve início pelas 16h, devido ao atraso do Presidente do Conselho de Justiça, estando presentes todos os 7 membros do Conselho de Justiça, decorrendo inicialmente de acordo com a ordem de trabalhos prevista.
F) Por volta das 17h, o Presidente e o Secretário, Dr. António Faria, ausentaram-se, suspendendo a reunião.
G) Com o reinício da reunião, o Presidente entregou ao vogal Dr. Fintas uma notificação da decisão por si tomada no sentido de o considerar impedido.
H)Tendo tomado conhecimento desta decisão do Presidente CJ, o Dr. Fintas inscreveu na mesma o seguinte texto: “Tomei conhecimento. Alego incompetência material, remetendo a questão para o pleno do CJ da FPF. 04/07/2008” .
I)Depois disto, o Dr. Fintas, irritado, levantou-se e disse ao Presidente do CJ: “ Vai para o raio que te parta!”
J)Alguns vogais tentaram acalmá-lo, tendo posteriormente a reunião ficado bastante tensa, havendo algumas trocas de insultos.
L)Instalou-se alguma confusão na reunião, nunca passando, no entanto, de palavras acaloradas e num tom de voz bastante elevado.
M)Não houve qualquer violência ou tentativa de violência física.
N) Dr. Troca-Tintas propôs a instauração de um processo disciplinar ao Presidente, bem como a sua suspensão imediata de funções.
O)A partir desse momento, o Presidente decidiu que as intervenções iriam ser directamente ditadas para a acta.
P)Às 17h55, o Presidente do CJ ditou para a acta a sua decisão de encerramento da reunião, por considerar que não estavam reunidos os requisitos mínimos para que esta se mantivesse.
Q)Seguidamente, o Presidente do CJ e o Vice- Presidente abandonaram a sala, não tendo sido advertidos que a reunião continuaria sem eles.
R)Às 19h45, sem a presença do Presidente ou do Vice-Presidente, os restantes 5 membros do Conselho de Justiça retomaram a reunião, tendo eleito novo Presidente, o Dr. Troca Tintas.
S)Entre as 21h30 e as 23h00 houve uma paragem para jantar.
T) Entre as 19h45 e as 00h45,foram aprovadas seis decisões, sendo elas : a revogação de decisão de encerramento do presidente, a decisão de instauração de um processo disciplinar e a decisão de imediata suspensão do Presidente, decisão de participação destas duas últimas decisões mencionadas aos Presidentes da Assembleia Geral e da FPF, apreciação e votação do recurso interposto pelo Dr. Troca-Tintas no fim da primeira parte da reunião, decisão de não tomar conhecimento quanto aos requerimentos de suspeição, apresentados antes da reunião, contra o Presidente do CJ.
U)Foram também aprovados os processos de recurso nºs 36, 37-38, 39-40, 41-42-43, 44-45, 46 e 47, incluindo os processos relativos aos autores.
V) A reunião foi encerrada ás 00h45, tendo nesse momento os cinco vogais assinado as actas da primeira e segunda partes da reunião
X) Na sequência do indeferimento dos recursos
- o Belavista F.C sofreu uma redução da sua visibilidade desportiva, televisiva e mediática, que levou á perda de patrocinadores, doações, direitos de transmissão e prémios de jogo, consubstanciando um dano nunca inferior a € 3.000.000,00 (três milhões de euros).
- ao Oporto F.C. foi vedada a possibilidade de tomar parte na “Liga Trilionária”, acrescem a isto perdas análogas ás sofridas pelo Belavista F.C., num valor nunca inferior a € 5.000.000,00 (cinco milhões de euros).
- Dourado Filho viu a sua imagem social e profissional denegrida, o que provocou na sua esfera pessoal danos nunca inferiores ao montante de € 500.000,00 (quinhentos mil euros).
- Costa do Pinto sofreu repercussões negativas na sua vida privada e profissional traduzidas num valor nunca inferior a € 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros).

III – Direito

As partes legítimas, nos termos dos artigos 9.º, 10.º, 55.º ,n.º 1, alínea c) e CPA ,foram citadas regularmente
Tendo em conta os factos dados como provados, há que tomar posição relativamente às seguintes questões:
- validade do encerramento da reunião do CJ do dia 4 de Julho 2008, pelo seu Presidente ás 17h55
- validade da acta da primeira reunião
- validade da alegada segunda reunião
- validade das deliberações nela tomadas
- validade da acta da segunda reunião

Desde logo, a admissibilidade da apensação de processos ao abrigo do disposto nos artigos. 61.º, 47.º, n.º 4, alínea b) 28.º nº1 e 4º b) CPTA, por estarmos perante uma cumulação de pedidos de impugnação de acto administrativo ilegal, condenação à pratica de acto administrativo devido e de indemnização.

Não cumpre aqui decidir, uma vez que não se encontra no âmbito do objecto do processo, as questões materiais relativas ao impedimento do vogal Dr. Fintas, a procedência dos recursos apresentados pelos dois clubes de futebol mencionados, nem a questão do processo disciplinar e da suspensão de funções do Presidente do CJ, levantada pelo Dr. Troca-Tintas, no final da primeira reunião.
O objecto do processo é somente apreciação da validade, formal e orgânica, das decisões tomadas pelos 5 vogais que prosseguiram a reunião depois do seu alegado encerramento pelo Presidente CJ.

Na sequência de investigações de natureza criminal, a Comissão Disciplinar da Liga “Cash and Carry” puniu os clubes de futebol Belavista F.C. e Oporto F.C., respectivamente, com a descida de divisão e a perda de 6 pontos, tendo também suspendido os seus Presidentes, Dourado Filho e Costa do Pinto, por um período de 4 e 2 anos, respectivamente. Desta decisão, interpuseram, os A.A., recurso para o CJ da FPF.
Esta é uma pessoa colectiva de direito privado, sem fins lucrativos, de tipo associativo. Apesar de ser uma entidade privada, foi declarada de interesse público e interesse público desportivo. Um dos seus órgãos sociais é o CJ, encarregue, entre outros aspectos, de decidir sobre os recursos que lhe são interpostos.
O funcionamento normal do CJ é regulado pelo Regimento do Conselho de Justiça da FPF. Nos casos omissos, o artigo 76.º do Regimento, manda aplicar, subsidiariamente, o CPA e o CPTA.
Tendo sido marcada uma reunião no CJ para o dia 4 de Julho de 2008, com a finalidade de julgar os recursos relativos às matérias acima descritas, esta decorreu nos trâmites normais, até o Dr. Fintas ter sido notificado da decisão do seu impedimento, momento em que a reunião se tornou agitada. Perante esta situação, o Presidente do CJ encerrou a reunião.
Tendo em conta os factos apurados, cumpre primeiramente decidir da validade do encerramento da reunião do CJ do dia 4 de Julho 2008, pelo seu Presidente ás 17h55 :
A primeira questão que se levanta, prende-se com o preenchimento do conceito de «reunião tumultuosa». Isto porque, nos termos do artigo 133.º, n.º2,alínea g) CPA,são nulas as deliberações de órgãos colegiais que forem tomadas tumultuosamente. A reunião do CJ do dia 4 de Julho 2008 tornou-se tumultuosa? No entendimento deste Tribunal, não. Para que uma reunião se encontre nesta condição, será necessário verificar uma perturbação anormal da ordem, uma confusão extrema que ponha em causa uma votação livre e esclarecida. O fundamento do artigo 133.º n.º 2, alínea g) CPA é precisamente o de evitar que, por um lado, fique em causa a liberdade e a integridade física dos membros presentes,por outro, que fique condicionada a possibilidade de livre e esclarecidamente reflectir, falar e votar.
De toda a matéria apurada, incluindo as provas testemunhais, resulta que esta reunião está longe de ter sido tumultuosa. Algum nervosismo, palavras acaloradas num tom mais elevado, alguma tensão, falar apaixonadamente e até mesmo o facto do Dr. Fintas se ter levantado, não configuram mais do que o normal funcionamento de um órgão colegial, em que , por vezes, as opiniões divergem.
Posto isto, conclui-se que a reunião não foi tumultuosa.

O que dizer, então, da decisão de encerramento antecipado?
Desde já, chama-se à colação o artigo 14.º CPA, que no seu n.º 2 dispõe: «Cabe ao Presidente do órgão colegial (...) abrir e encerrar as reuniões...». No entanto, nos termos do n.º 3 , só pode fazê-lo, antecipadamente, «quando circunstâncias excepcionais o justifiquem, mediante decisão fundamentada a incluir na acta». Cabe,mais uma vez, preencher um conceito indeterminado: circunstâncias excepcionais.
No nosso entender, seriam extravasam claramente aquilo que é considerado normal, situações de risco, ou de gravidade extrema, que impossibilitem a continuação do funcionamento do orgão.
Como podemos verificar, é um poder condicionado,do qual o Presidente só pode fazer uso nos estritos termos da lei.
Muito embora agitada, já vimos anteriormente que a reunião não excedeu a normalidade, não se enquadrando na previsão do artigo 14.º nº3 CPA.
Toda a actividade administrativa rege-se pela estrita obediência aos princípios da proporcionalidade e da prossecução do interesse público.
Ao tomar a decisão de encerramento antecipado da reunião consideramos violados ambos os princípios supra mencionados.
Foi violado o princípio da proporcionalidade ( artigo 5.º n.º2CPA) nas suas três vertentes: adequação, dado que estavam abertas outras vias de resolução do problema menos gravosas, nomeadamente a suspensão da reunião que pela descrição dos factos seria o suficiente para acalmar os ânimos; necessidade, uma vez que esta não era indispensável à prossecução do interesse publico; proporcionalidade stricto sensu, já que não houve uma justa ponderação entre custos/benefícios, não podemos esquecer que em cima da mesa estavam decisões urgentes e de extrema importância para o mundo futebolístico.
Foi também violado o princípio da prossecução do interesse público, uma vez que o Presidente rege a sua actuação por mero interesse pessoal.
Senão vejamos: como já foi dito estava em causa a apreciação de questões da maior urgência e havia condições para a reunião continuar. Apesar disto, perante a proposta do Dr. Troca-Tintas de instauração de um processo disciplinar e imediata suspensão de funções, proposta essa que lhe era desfavorável, o Presidente desconsiderou todo o interesse público que ditava a continuação da reunião, limitando-se a sair da sala e a dá-la como encerrada, não tendo sequer o cuidado de marcar uma nova data para a sua realização.
Vem o Tribunal a entender que a decisão de encerramento antecipado da reunião é inválida, padecendo do desvalor jurídico da nulidade.
Apesar de aparentemente cairmos no âmbito do artigo 135.º CPA, por estar em causa a violação dos referidos princípios, consideramos aplicar-se ao caso o disposto no artigo 133.º n.º1 do CPA, dado que falta ao acto administrativo um dos seus elementos essenciais: o fim legal, por não ter sido prosseguido o interesse publico.


Resolvida a questão da validade do encerramento da reunião, cabe agora apreciar a validade da correspondente acta.

Estando preenchidos os requisitos formais exigidos à luz do artigo 27.º nº 1 CPA, o n.º 2 exige um rol de formalidade que não foram observadas que invalidaria a dita acta. Todavia tem aplicação directa neste caso o artigo 33.º do Decreto-Lei 144/93, de 26 de Abril, por estarmos perante a acta de uma federação desportiva.
Um único problema se levanta : o facto de a acta conter apenas a mera rubrica dos 5 vogais e não a assinatura completa. No entanto tal situação não acarreta qualquer desvalor para a acta. A rubrica é suficiente para confirmar que os vogais tomaram conhecimento do seu conteúdo, esta é a ratio da disposição.
E também não se diga que o facto de os vogais terem rubricado a acta significa que eles tenham aceite como válida a decisão de encerramento pelo presidente. A rubrica mostra apenas que eles tomaram conhecimento e confirmam a factualidade descrita.

Quanto à continuação da reunião:
Tal como já foi decidido, a decisão de encerramento da reunião foi nula, logo não obriga os seus destinatários ( artigo 134.º, n.º 1 e n.º2). Assim sendo, a reunião nunca chegou a ser verdadeiramente encerrada, este segundo momento não é mais do que a sua continuação, não configurando uma reunião autónoma.
Não obstante a saída do Presidente e Vice-presidente, o quorum está preenchido, à luz do artigo 5.º Regimento do CJ.
Na falta do Presidente o orgão colegial deve eleger um novo para dirigir os trabalhos, assim o fizeram os vogais validamente nos termos do artigo 4 Regimento do CJ.

No que toca às seis decisões tomadas pelos cinco vogais:
1- revogação da decisão de encerramento: esta tem-se por eliminada, uma vez que versa sobre uma decisão nula, não tendo assim objecto jurídico.
2- instauração de processo disciplinar: apesar de admissível nos termos do artigo 11.º n.º1 b) Regimento CJ,não podia ser votada naquela reunião, por não constar da ordem de trabalhos. Embora caia na ressalva do artigo 19.º CPA, pelo carácter urgente das deliberações a serem tomadas, esta não foi accionada.
Por ter sido preterida uma formalidade essencial, este acto é anulável nos termos gerais do artigo 135.º CPA.
3- imediata suspensão do presidente: alem de padecer do mesmo vicio da anterior, constatamos a violação de um direito de natureza análoga aos direitos liberdades e garantias nos termos dos artigos 17.º in fine e 18.º Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), o direito de audiência dos interessados. Fruto da exigência constitucional do artigo 267.º n.º 5, vem o artigo 100.º CPA consagrar um meio de o particular ser ouvido no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ainda ser informado sobre o seu sentido provável.
Contrariamente à parte da Doutrina que considera existir aqui uma mera anulabilidade, nos termos gerais do artigo 135.º CPA, somos de opinião que se aplica, sem margem para dúvidas, o artigo 133.º, n.º 2, alínea d) CPA, o qual comina o vício com nulidade.
4- participação destas duas decisões aos Presidentes da Assembleia Geral e da FPF : do ponto de vista jurídico nada temos a dizer.
5- Apreciação e votação do recurso interposto pelo Dr. Fintas no fim da primeira parte da reunião : a decisão, por parte do Presidente, de impedimento do Dr. Fintas é nula dado que a competência era da AG nos termos dos artigos 23.º n.º 5, 71.º n.º 4 dos Estatutos FPF.
Foi praticado um acto por um orgão que não tinha competência para o mesmo sendo que o orgão com competência para a pratica daquele acto pertence à mesma pessoa colectiva, assim o desvalor seria em princípio a anulabilidade, por vício de falta de competência. No entanto, a verdade é que existe uma estrita separação de poderes entre os orgãos da FPF, e esta actuação não configura um mero vício de falta de competência mas sim de falta de atribuições. Sendo assim, o acto é nulo,nos termos do artigo 133º nº2 b)CPA, não carecendo de revogação.
6- Requerimentos de suspeição contra o Presidente do CJ:nada de juridicamente relevante quanto a decisão dos vogais de não tomar conhecimento do assunto.

Relativamente à apreciação dos recursos da tabela faremos uma analise conjunta de todos eles, já que não há nada que juridicamente justifique a sua diferenciação.
Cumpre apenas dizer que as decisões sancionatórias proferidas pela Comissão Disciplinar da “Liga Cash and Carry” eram da sua competência cabendo delas recurso para o CJ (artigos 55º e 56º Regimento CJ).

Por último analisamos a questão problemática da existência ou não de duas actas autónomas. A questão é simples, nos termos do artigo 27 CPA, a cada reunião corresponde uma, e uma só acta. Vimos que houve apenas uma reunião, assim, há também uma só acta embora fragmentada.

IV. Decisão

Nos termos expostos, nega-se provimento aos pedidos dos autores.
Condenam-se os autores no pagamento das custas judiciais, repartidas igualmente por força do artigo 446.º, n.º 1, 2 e 3 do CPC , por remissão do artigo 1.º CPTA..

Registe e notifique.

O colectivo de juízes,

Maria Pinto Coelho Almeida e Silva

Maria Oliveira Martins Oom Sacadura

Marta de Aragão e Pina Cabral


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